FGV
Analista
Prefeitura de Osasco
2014

O ídolo

Em um belo dia a deusa dos ventos beija o pé do homem, o maltratado, desprezado pé, e desse beijo nasce o ídolo do futebol. Nasce em berço de palha e barraco de lata e vem ao mundo abraçado a uma bola.

Desde que aprende a andar, sabe jogar. Quando criança alegra os descampados e os baldios, joga e joga e joga nos ermos dos subúrbios até que a noite cai e ninguém mais consegue ver a bola, e quando jovem voa e faz voar nos estádios. Suas artes de malabarista convocam multidões, domingo após domingo, de vitória em vitória, de ovação em ovação.

A bola o procura, o reconhece, precisa dele. No peito do seu pé ela descansa e se embala. Ele lhe dá brilho e a faz falar, e neste diálogo entre os dois, milhões de mudos conversam. Os Zé Ninguém, os condenados a serem para sempre ninguém, podem sentir-se alguém por um momento, por obra e graça desses passes devolvidos num toque, essas fintas que desenham os zês na grama, esses golaços de calcanhar ou de bicicleta: quando ele joga, o time tem doze jogadores.

− Doze? Tem quinze! Tem vinte!

A bola ri, radiante, no ar. Ele a amortece, a adormece, diz galanteios, dança com ela e, vendo essas coisas nunca vistas, seus adoradores sentem piedade por seus netos ainda não nascidos, que não estão vendo o que acontece.

Mas o ídolo é ídolo por um momento, humana eternidade, coisa de nada; e quando chega a hora do azar para o pé de ouro, a estrela conclui sua viagem do resplendor à escuridão. Esse corpo está com mais remendos que roupa de palhaço, o acrobata virou paralítico, o artista é agora uma besta:

− Com a ferradura, não!

A fonte da felicidade pública se transforma no para-raios do rancor público:

− Múmia!
Às vezes o ídolo não cai inteiro. E às vezes, quando se quebra, a multidão o devora aos pedaços.

(GALEANO, Eduardo. Futebol ao sol e à sombra. Porto Alegre: L&PM, 1995, p. 5)
Vocabulário:

finta: drible

Como se trata de um texto de cunho literário, há na crônica presença expressiva da linguagem figurada.

O trecho em que se pode identificar um exemplo de prosopopeia (também chamada de personificação) é:

Comentário rápido

Quando a alternativa diz que “a bola procura”, ela está dando vida a um ser inanimado (a bola), garantindo que é a bola que procura.

A alternativa “D” do trecho “A bola o procura (…). Ele lhe dá brilho e a faz falar, (…)” é um exemplo claro de prosopopeia ou personificação.

Neste caso, a bola, um objeto inanimado, é descrita como se tivesse a capacidade de procurar e reconhecer o jogador, além de “falar”, o que lhe atribui qualidades humanas ou animadas.

O que é personificação? Qual é seu sinônimo?

Sinônimo: prosopopeia.

Personificação é uma figura de linguagem utilizada para atribuir características humanas a seres inanimados, animais ou conceitos abstratos.

É uma forma de expressão que enriquece o texto, tornando-o mais vívido e imaginativo.

Exemplos:

  • O Chapéu Seletor murmurou em seu ouvido, ponderando profundamente onde ele melhor se encaixaria, como se estivesse dividido entre velhos amigos.
  • O Ford Anglia voador rugiu para a liberdade da Floresta Proibida, como se estivesse determinado a nunca mais ser aprisionado.
  • O Mapa do Maroto zombou de Snape com palavras afiadas, defendendo seus verdadeiros mestres com lealdade feroz.
  • A Floresta Proibida sussurrava e gemia, seus segredos escondidos nas sombras, como se estivesse alertando os intrusos a se manterem afastados.

Prosopopeia ou personificação-01

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